Revista Isto é
"Dinheiro"
Negócios

Junho de 2005
no.403 - Página 58

Embraer do futuro


Paranaense IPE nem sequer produz um avião por mês, mas vai abrir fábrica na China

 
 

Há mais mistérios entre o céu e a terra paranaenses do que supõe nossa vã filosofia. A curitibana IPE, fabricante de aviões monomotores, prepara-se para abrir fábrica na China, seguindo os passos da Embraer. A internacionalização não surpreenderia se a IPE não tivesse apenas quinze funcionários, faturamento anual de US$1 milhão e produção de menos de uma unidade por mês. “Estou assustado, mas já assinei o protocolo com os chineses”, garante João Carlos Boscardin, sócio da Indústria Paranaense de Estruturas. O convite dos chineses surgiu através de uma consultoria carioca. “Recebi um telefonema propondo o encontro. Viajei ao Rio, gostei da idéia e, em agosto, viajo para Shenyang, na China, para fechar negócio”, explica Boscardin, em estado de graça. “Na mesa de reuniões, claro que fico temeroso. Mas quando vejo a qualidade do meu avião, perco qualquer receio”.

   

Fundada em 1972, por seu pai, também chamado João Carlos, a IPE sempre perseguiu o sonho de trilhar o caminho da Embraer. “Eles também começaram fabricando planadores (aeronaves sem motor), como a gente”, orgulha-se Boscardin filho. No início dos anos 60, o engenheiro civil João Carlos Pessoa Boscardin vivia se enroscando nos hangares do aeroclube de Curitiba. Dublê de mecânico, ele gostava e entendia de aviões e planadores. Quando aparecia algum quebrado, Boscardin não hesitava em enfiar as mãos na graxa. Aprendeu rápido. E abriu sua própria fabrica em um galpão no centro de Curitiba, onde funcionava a serralheria da família. “Durante anos, meu pai fabricou planadores escondido do meu avo , confidencia Boscardin. Foram 300 aeronaves desse tipo nos últimos trinta anos”.

 
 

Mas o sonho de construir aviões mantinha-se vivo. De dois anos para cá, pai e filho investiram R$ 11 milhões para consolidar o projeto IPE-06A, especifico para instrução de pilotos e vigilância. “O Departamento de Aviação Civil prevê demanda de 250 aeronaves por ano”, diz o filho, ressaltando que o preço de venda do avião é US$ 100 mil. A IPE, que planeja montar um avião por mês a partir de julho, tem como nova meta aprender mandarim. “Devido à concepção do avião, ele pode ser construído rápido. Os chineses estão com pressa, pois possuem imensa demanda na formação de pilotos”, diz Boscardin, já calculando como será a vida na ponte-aérea Bigorrilho (bairro central de Curitiba)/Shenyang.

O Nhapecan-II demonstrou ser um planador seguro e fácil de voar, extremamente tolerante e estável. E também robusto e de manutenção simples, e seus pequenos defeitos (ergonomia de comandos, detalhes de cockpit e falta de aviso de estol) são facilmente corrigíveis na produção seriada. Bem “limpo” e nas mãos de um piloto bem treinado, deve permitir um desempenho nada desprezível quando comparado com máquinas importadas de média performance, com L/D de 35:1.
A obtenção do CHT abrirá portas de muitos mercados de exportação (Estados Unidos, América Latina e Europa), tendo em vista o preço mais que competitivo e as boas características de vôo. Valeu o esforço do CTA, cujo trabalho profissionalíssimo na condução do processo de homologação garantirá o reconhecimento do CHT fora do Brasil. Valeu a persistência da IPE, na pessoa de seu Diretor Presidente, eng9 J.C. Boscardin, que acreditou no projeto até o fim, enfrentando os mais sérios obstáculos e problemas financeiros sem desanimar, até ter o seu Nhapecan-II pronto para a fabricação seriada, com o CHT praticamente na mão.
Assim, dá para acreditar no futuro do vôo à vela no Brasil: teremos brevemente o reequipamento de clubes com planadores de instrução Nhapecan-II. Nota Em paralelo, busca-se resolver o problema da falta de aviões rebocadores. Soluções à vista: importação de rebocadores “Aero Boero” da Argentina, conversão de P-56 para 150 HP e conversão de T-23 Uirapuru para o trabalho de reboque. O CEV -CTA provou que mesmo essa última hipótese é perfeitamente viável.